Respondendo a duas observações feitas pelos leitores a partir do post da semana passada. A de hoje é sobre essa questão da quantidade de peças.
1) O sujeito aqui reclama que eu estaria sugerindo que diminuíssem o número de espetáculos em cartaz no Rio, que eu estou nadando contra a corrente e enfraquecendo o movimento...
Não, não, acho que estou sendo mal compreendido. Esse negócio de blog é legal, mas o espaço nunca é suficiente. Bacana seria uma tese, um livro, sei lá, alguma coisa mais consistente. Mas no momento, é o que temos. Então usemos.
Nunca falei aqui nada contra o número de peças. De repente posso ter dado essa impressão pelo tom algo espantado como me refiro à coisa. Mas é porque eu imaginava menos peças em cartaz e acho que me surpreendi quando comecei a contar. Não sei se 54 espetáculos profissionais adultos (essa é a média do presente mês de maio) por final de semana é um número alto ou baixo para a cidade do Rio de Janeiro. São Paulo, dizem, tem mais de 150. E o fim de semana teatral em São Paulo tem um dia a menos que o nosso. Mas, também, lá também parece ter muito mais salas de espetáculos (ou não?). Quem sabe se tivéssemos mais salas de espetáculos ou tantas quanto eles ainda teríamos mais peças de teatro em cartaz do que São Paulo? Quem sabe?
Comparo com São Paulo e não sei se é a melhor comparação. Ou se deveria estar comparando com Nova Iorque, Paris, Cidade do México, Madri, ou Buenos Aires. Qual dessas cidades se parecerá mais com a nossa em quantidade de peças/habitante interessado em assisti-las? Ou em termos de fomento, em quantidade de grupos e de produtores independentes? Seja como for, não tenho como afirmar se esse número de peças em cartaz aqui é demais ou de menos para os cidadãos cariocas.
O que acho sim, fora do normal (mas o que será o normal?) é o tempo que cada uma dessas peças, em geral, tende a permanecer em cartaz. Senão vejamos.
Considerando os cinco primeiros meses de 2011, o Rio de Janeiro já apresentou ao seu público um número superior a 200 títulos de espetáculos teatrais. Entre os que estrearam este ano, os que vieram do ano passado ou de anos anteriores, reestréias, espetáculos de mostras, produções locais ou de outros estados, etc. Aliás, como deixei de contar algumas semanas, acho que 250 títulos é, na verdade, uma estimativa mais realista.
E só estou falando, bem entendido, de fins de semana. E de teatro adulto. Nada contra os outros dias da semana, nem contra o teatro infantil. Faço isso só para delimitar um pouco a amostragem. (Contando também os infantis, a média de espetáculos no Rio por final de semana é de setenta e poucos).
Se considerarmos que, na cidade toda, contando direitinho, só vamos achar umas 50 salas ou “espaços” em condições de receber esses mesmos espetáculos em cartaz... São cerca de 5 espetáculos por sala. Em cinco meses: cada espetáculo tem exatamente um mês, em média, para se apresentar. Logo, cada peça que ultrapassa esse tempo de permanência (e algumas conseguem) empurra umas tantas outras para novos espaços, para fora do cartaz, para os horários alternativos ou sei mais para onde pode ir uma peça a procura de público nessa cidade. Há falta de salas? Bem, parece evidente que há falta de salas. Mas os espetáculos se acotovelam de fato apenas pela falta de salas? E, se houvesse mais salas, durariam mais tempo em cartaz?
Como quase tudo aqui nesse blog, sem a metodologia adequada, sem números confiáveis, sem uma pesquisa séria e consistente, o que podemos fazer com o que temos, é estimar, imaginar e aproximar nossa imaginação do real.
Se houvesse uma relação mais simples entre o número de salas existente na cidade e a quantidade de espetáculos que produzimos, a tendência seria diminuir o número de espetáculos numa proporção pelo menos assemelhada ao número de salas que se fecham. Ou só aumentar o número de peças na medida em que aumentassem o número de “espaços” para abrigá-las. Não é o que se observa, no entanto. O número de espetáculos este semestre cresceu quase 10% em relação ao semestre passado (de 45 para 50). E a única sala nova que me lembro que abriu nesse mesmo, e há menos de 15 dias, foi o Teatro Poeirinha, em Botafogo, com capacidade para 70 pessoas.
Isso de público também é um indicativo que funciona ao contrário no teatro carioca. No semestre passado a média de público me pareceu (pelo que me diziam os produtores, como é difícil fazer um estudo sem números!) acima da média desse semestre. E, assim como no caso das salas, a produção da cidade parece ter ignorado essa retração de espectadores. E continuou aumentando. E quando vai parar de crescer? E em função do que deve realmente aumentar?
Um elemento importante na elevação da média de espetáculos em cartaz na cidade neste semestre, com o conseqüente aumento no rodízio de peças nas salas disponíveis pode ter sido o maior aporte da verba de fomento do município - a última edição do FATE foi generosa. Isso deu uma estimulada extra na produção. E, além disso, estávamos contando com os editais do governo federal, que estão atrasados até agora. Claro, o edital da Prefeitura não deu conta de tudo. Mas, com projetos em andamento e sem outra saída, muitos produtores podem ter optado por realizar os seus projetos mesmo sem receber os patrocínios que contavam.
Seja quais forem as causas, o fato é que, neste semestre, aumentou a pressão de uns espetáculos sobre os outros, com a conseqüente diminuição das temporadas médias para abaixo das “históricas” 32 semanas. Pode ser sazonal. Pode ser que, no próximo semestre, haja uma retração e voltemos aos números mais “razoáveis” de temporadas anteriores. Mas quem pode considerar saudável um teatro com a maioria das peças se espremendo em temporadas de até dois meses no máximo?
Ou talvez seja mesmo assim no mundo inteiro e nós não tenhamos nada de incomum com relação ao que se faz em outros lugares deste mundo.
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